sábado, 30 de dezembro de 2017

Nissan Kicks SL

Atrevida! É assim que a Nissan quer ser vista no mundo dos automóveis. E essa audácia e coragem repentinos trazem ao Brasil um carro diferente do que você se acostumou a ver nas concessionárias da marca. O Kicks não tem apenas um ou outro detalhe instigante. Feito do zero, ele escapa da normalidade, dos traços sóbrios e das soluções comedidas, comuns aos japoneses.
Disponível apenas na versão SL, ao preço de R$ 89.990, ele vem para brigar com Honda HR-V e Jeep Renegade, os líderes do segmento SUV compacto, que nas suas versões topo de linha cobram R$ 99.200 e 96.760 respectivamente. O preço mais em conta, trazendo um nível de equipamentos superior, é um dos poucos traços genéticos da Nissan que foram mantidos.
INDENIZA
Ele usa basicamente a mesma estrutura de March e Versa, os carros mais baratos da marca no Brasil. A plataforma “V” barateia o projeto como um todo, mesmo alongada (16 cm extras de entre-eixos) e alargada (9 cm). Enquanto o HR-V usa a base do Fit, um tanto mais sofisticada que a da Nissan, e o Renegade tem uma plataforma completamente nova (FCA Small Wide), mais moderna até que a do Honda. 
Sob o capô, outra sábia economia. Por ali trabalha o mesmo motor 1.6 16V da dupla compacta, com comando variável na abertura das válvulas (CVVTS), e que passou por um remapeamento da injeção eletrônica para ganhar 3 cv e 0,4 mkgf de torque. Agora são 114 cv e 15,5 mkgf disponíveis a 4.000 rpm. Economizando por um lado, a Nissan “indeniza” quem pagar quase R$ 90 mil pela versão SL, única disponível até o momento, com equipamentos tecnológicos que você não tem nos concorrentes. 

O câmbio CVT, por exemplo, ganhou a função D-Step, que simula seis trocas de marchas durante acelerações mais fortes. O sistema reconhece que o seu pé ultrapassou os 50% da carga do acelerador e começa a funcionar. Algo que nem o Sentra, sedã médio da marca, tem. Mas antes de contar como é a experiência a bordo passemos pelo desenho.
Pensado para o Brasil, e desenvolvido pelos cinco estúdios que a marca tem no mundo, ele manteve intocado o desenho que se viu no Salão do Automóvel de 2014. Isso culminou em um carro sem obviedades. Tudo bem, você olha a frente com o detalhe em V na grade e repara que o Kicks segue a linhagem dos irmãos Sentra, March e Versa. Mas o DNA perde força a partir daqui.
Repare nos faróis e como eles são marcantes, criando um degrau até o capô, que se estende também pelo para-lamas. Nas laterais há vincos acintosos nas partes superiores e inferiores das duas portas. Na linha das janelas ele atende ao conceito Resonance criado para os SUVs da marca. No teto, por R$ 2.500, você pode ter a cor laranja, em contraste exclusivamente com o cinza grafite. Suas rodas têm 17” e, sinceramente, poderiam ser maiores, dada a agressividade do conjunto.
A traseira começa na invasão da lanterna ao para-lamas e formando um grande degrau entre as peças e o vidro traseiro. “A parte mais desafiadora do desenvolvimento do design foi, sem dúvida, conciliar o desenho das lanternas traseiras e a inclinação dinâmica da janela traseira sem desconsiderar os espaços para carga e para os passageiros de trás”, como conta Robert Bauer, chefe do estúdio-satélite Nissan Design Rio.
360 GRAUS
Na prática, é um carro que se destaca na multidão, algo impossível de quantificar em valor. Mas a sensação real é a de que se tem mais nele, pagando menos. Por dentro isso se potencializa. Começando pelos bons bancos dianteiros que usam da tecnologia ZeroGravity, desenvolvida junto com a Nasa, e presentes no Altima.
O painel transborda simplicidade, com linhas retas e sem um mundo de botões. A central multimídia está ali, isolada, com sua tela de 7” e dois botões bem funcionais aliados ao touchscreen. Eles facilitam a sua interação como sistema. Há sistema de navegação NissanConnect, capacidade de espelhamento do celular, conector USB e Bluetooth. Nela  você tem acesso ao melhor assistente de manobras da categoria. Com câmeras posicionadas na grade dianteira, abaixo dos retrovisores e na tampa traseira, o Kicks projeta uma imagem de 360º graus em volta do carro.
No cluster de instrumentos, o velocímetro analógico fica à direita enquanto um monitor de TFT (Thin Film Transistor) se torna um computador de bordo, à esquerda. Além de permitir que você tenha por ali o tradicional conta-giros, ele traz mais 11 funções como, por exemplo, o curso de navegação via GPS, a economia de combustível, a temporização das luzes de boas-vindas. Por ali também é possível configurar o controle de chassi... Isso mesmo!
O Kicks traz um inédito controle dinâmico de chassi e carroceria. Como tem maior altura do solo, a marca instalou sensores que medem a ondulação e pêndulo da carroceria, quando os níveis ultrapassam os limites aceitáveis, os freios entram em ação sutilmente e devolvem a estabilidade ao conjunto. O mesmo acontece em curvas, onde o sistema ativa também freio motor do carro para aumentar o controle do motorista. Sabendo disso tudo, você se posiciona a bordo e espera por uma experiência nova. E tem!
Não chega a ser como a invenção de um drible, mas na chegada você nem precisa da chave, e encontra o botão de partida perto da alavanca de câmbio, mais fácil de encontrar do que se estivesse grudado no painel. Seu acabamento merece elogios, com uma única ressalva aos plásticos das portas, quer poderiam ser mais suaves ao toque.  A posição de dirigir é bem semelhante a um carro de passeio, e a amplitude da regulagem de altura do banco chega a 6 cm. O volante é exclusivo, com base achatada e os comandos do computador de bordo e do som ficam nas hastes, em uma posição intuitiva e mais precisa que nos rivais.
A visibilidade é satisfatória, ainda que a coluna C seja larga demais para respeitar o desenho ousado. Já quem viaja no banco traseiro não tem tanto espaço quanto imaginávamos, levando em consideração o que o Versa oferece. São 27 cm de distância entre o banco traseiro e o encosto dianteiro. Num HR-V há 10 cm a mais. Já o porta-malas de 431 litros é o maior da sua categoria.
CAVADINHA
Dirigí-lo requer uma dose de compaixão. Apesar do torque vir nitidamente mais cedo nele do que nos irmãos March e Versa com o CVT comum, ainda é pouco perto do que você tem a bordo de Honda e até do Ford Ecosport. A suavidade quase incômoda inicialmente vira paz e tranquilidade com o passar do tempo. É clara a intenção dele em lhe dar conforto enquanto vê os olhares admirados com a sua passagem. Foi como andar de cavalinho nas costas do Neymar.
Se o CVT aumenta o som na cabine quando se acelera, exagera no silêncio em todo aquele tempo em que se está apenas indo de um canto para outro, sem pressa. A direção tem um grau de anestesia aceitável para quem está a 20 cm do chão, mas como o diâmetro de giro é pequeno e a carroceria se mantém equilibrada, fica fácil se sentir seguro para fazer desvios rápidos e entrar mais rápido nas curvas.
Nas provas de aceleração ele atingiu resultados dentro do esperado, e fez de 0 a 100 km/h em 11,6 s. A principal ressalva ficou por conta do tamanho do tanque. Na obstinação por perda de peso, a Nissan colocou um reservatório de apenas 41 litros. Na cidade, com média de 9,1 km/l de etanol, é possível rodar 373 km, o que pode incomodar quem já se acostumou com tanques maiores. Ainda que os números de consumo sejam satisfatórios, irrita ter de parar mais vezes para abastecer.    
Voltando às boas novas, ele exagera na economia quando o assunto é manutenção. Até os 60 mil quilômetros são seis revisões que custarão R$ 2.994. A Honda cobra R$ 3.907 no mesmo período com o HR-V, e a Jeep faz cinco revisões do Renegade durante a mesma quilometragem por R$ 3.772. 
As primeiras unidades do Kicks, como a das fotos, vêm importadas do México. A produção em Resende, RJ, apesar dos R$ 750 milhões de investimento extra, está prevista para começar no primeiro semestre de 2017, e a partir daí a Nissan iniciará as vendas das versões SV e S, mais baratas. “Na fábrica mexicana temos 30 anos de experiência na fabricação dos nossos carros, e o Kicks é um produto que prima pela excelência. Preferimos não arriscar com pouco tempo para lançá-lo”, conta Arnaud Charpentier, diretor de marketing da Nissan. Pois é... Vacilar com um produto tão correto seria atrevimento demais. Como perder um pênalti batendo de cavadinha.

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